sexta-feira, 2 de julho de 2010

"O limite da estupidez"

O Brasil ficou triste, chateado, com raiva, pena e perplexo. Fiquei o resto do dia pensando o que escrever sobre a queda da seleção. Agora pouco lembrei de uma coluna de João Saldanha, publicada no Jornal do Brasil, em 6 de julho de 1982, após a nossa derrota para a Itália, na Copa da Espanha: "O limite da estupidez". Não preciso escrever mais uma linha sobre essa passagem esquecível do time de Dunga.
Segue o texto do João:

Barcelona - "Tantos crimes contra o bom senso, contra o senso comum, não poderiam passar impunemente. O fato de possuirmos jogadores extra-série como Zico, Falcão, Sócrates, Júnior e Cerezo davam(sic) a falsa impressão de que éramos superiores em tudo. Mas uma estupidez siderúrgica rondava nosso propósito de ganhar uma Copa, onde quem nos derrotou passou mal com o país dos Camarões. Inventaram uma tática no Brasil abandonando preciosos espaços de campo. Ora, somente um primarismo infantil e teimoso poderia pensar que os adversários não iriam aproveitar o erro clamoroso.
Veio logo o primeiro jogo, o da União Soviética. Sim, foi uma falha de Valdir Peres e isto é uma outra questão. Mas o time soviético, quando se apertava, jogava a bola para seu lateral esquerdo que sempre estava livre. Claro, raios que me partam, pois se não tínhamos ninguém ali. Leandro, sempre mal fisicamente, tentava suprir o extrema que não tínhamos.

No jogo da Itália, com mais quinze minutos sairia levado pelas enfermeiras não para um hospital, mas para um cemitério. Estava morto de cansaço. E o Cabrini folgava sempre. Era jogada de desafogo do time italiano. Qualquer problema e bastava jogar a bola por ali. Fizeram o primeiro e, quando precisavam da cera, bastava segurar o jogo pelo lado onde tínhamos apenas o Leandro.

Sim, Zico, Sócrates, Júnior, Cerezo e este estupendo Falcão sempre estiveram muito bem. Mas até carregadores de piano cansam quando fazem esforços acima de sua capacidade. Nosso time, com a tão decantada preparação especial, estava muito cansado no final do jogo. De um lado, existe algo positivo que é a desmistificação do charlatanismo. Os inventores do futebol que se recusam a ocupar espaços indispensáveis e que não percebem que se joga num retângulo, rigorosamente geométrico, e querem jogar enviesado como se as balizas estivessem nos córneres.

Se chegamos a uma posição tão elevada, devemos à qualidade de quatro ou cinco jogadores excepcionais, mas cuja capacidade física também tem seus limites. A Copa não era difícil de ganhar. Mas a teimosia superou tudo. Culpar Serginho seria um erro. O jogador não tem culpa da teimosia que ficou clara no primeiro jogo, mas infelizmente não foi aproveitada. Não deixo de assinalar que faltou um pouco de modéstia quando empatamos ontem em 2 a 2. Alguém andou rebolando ali e o time italiano, que estava melhor fisicamente do que o nosso, veio para cima e pôde ganhar. Paciência. Mas a estupidez tem um limite de tolerância".

2 comentários:

Luciano disse...

Amigo André, não consigo ver Telê como estúpido. Era um idealista ao seu modo, como João. Era um sonhador.
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Dunga, por outro lado, é estúpido, limitado e limitador. Um homem triste que não inspira ninguém.
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Telê e João foram inspiradores!

Unknown disse...

Muito interessante a observação de Saldanha a respeito dos "espaços no campo" deixado pelo time de 82. Revi o jogo recentemente e fiquei impressionado justamente com isso - desfez um pouco aquela imagem mitológica que tinha do time que tanto me fez sofrer quando eu tinha 15 anos... (não que não fosse um escrete - ou ao menos uma seleção com cinco ou seis foras de série, como quer Saldanha).

Mas não vejo como correlacionar Telê82 com Dunga-2010. Antes,se havia tais espaços, era porque o humilde Telê os sacrificou em prol de um futebol espetacular, alegre, audacioso. Com o arrogante Dunga não temos nada disso, mas tão-somente o conservadorismo vesgo das convocações e das táticas, encoberto pelo velho autoritarismo obstinado que, por razões que prefiro fingir não reconhecer, tanto fascina a torcida... ao menos enquanto o time não perde e volta para a casa.