sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

João Saldanha e o Frescobol

O visionário João Saldanha escreveu o texto abaixo no final dos anos 60, na Última Hora. Como faz falta o nosso João cidadão.

O Frescobol

Uma das melhores coisas, do ponto de vista de esporte, como forma de recuperação física, para gente de qualquer idade é ir à praia. Logicamente, ir à praia é quase um privilégio. Não é em todos os bairros que há praia. Nem em todas as cidades, mas no Rio de Janeiro acha.
Acontece que a praia quase se transformou num inferno. É mais fácil atravessar a Avenida Atlântica, em Copacabana, e a Vieira Souto, em Ipanema, apesar do tráfego intenso, do que atravessar a areia para dentro da água. Quem quiser comprovar que dê um pulo na praia e verifique.
Se o "transeunte" não for de circo está sujeito, no mínimo, a uma lesão que não raro é uma fratura exposta. O pessoal do frescobol, com suas raquetinhas, varejando uma área que fica entre a areia seca e a água, obriga ao banhista verdadeiros passos de twist para poder passar a barreira das raquetes. E como mandam brasa! Cabeça é fria. Salve-se quem puder. E quando a gente leva uma sobra, dizem um "desculpa", que quer dizer mais "sai da frente, palhaço".
Já saiu muita briga por causa disto. Brigas feias. Principalmente por pais de crianças que já não podem brincar mais na beira do mar que é exatamente a faixa interditada pelos jogadores do frescobol. Há poucos dias, foi uma menina que teve o olho arrancado pela raquetada. No dia seguinte, no mesmo lugar, foi uma garoto de três anos que foi ao Miguel Couto com duas fraturas no braço direito. Uma outra garotinha, menos de cinco anos, teve violento arrancamento de couro cabeludo. Esta estatística dos últimos quinze dias não foi obtida nos hospitais ou no distrito policial. Esta é a que presenciei. A dos hospitais já está ficando maior do que a outra não menos triste, que é a dos desastres de lambreta.
Felizmente, parece que agora a coisa vai parar mesmo. O prefeitinho de Copacabana, Dias Lopes, justamente indignado com os abusos e excessos, depois de uma dose muito grande de paciência e tolerância, vai pôr um fim ao negócio. Elaborou uma regulamentação, pediu ajuda às autoridades estaduais e as obteve com energia. Salve! O frescobol, a partir do dia vinte e um de setembro, só será permitido jogar, depois das 14 horas.
É mais do que justa a medida. O horário fixado é o mesmo do futebol de praia. Dá perfeitamente aos amantes do "fresco" se deleitarem sem prejudicar a imensa maioria de pessoas, crianças principalmente, que vão à praia somente para banho de mar.
(João Saldanha, Última Hora)